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Nicolau Saião, O livro das cidades

 

Traduções - diversos autores

 

 

TEMPO DIFERENTE

 

(Benjamin Péret)

 

O sol da minha cabeça é de todas as cores

É ele que ilumina as casas

de palha

onde vivem os senhores saídos das crateras

e as belas mulheres que em cada dia nascem

e em cada tarde morrem

como os mosquitos.

Mosquito de todas as cores

que vens tu fazer aqui?

O sol   este sol    é para cães

e o calor sacode as montanhas

enquanto as montanhas nadam

sobre um mar pleno de luzes

onde o calor e o peso da vida

não existem

- onde eu não meteria nem a ponta do meu pé.

 

 

 

A DOENÇA IMAGINÁRIA

 

(Benjamin Péret)

 

Eu sou o cabelo de chumbo

que viaja de astro em astro

que se tornará em cometa

e num ano e num dia te destruirá.

 

Mas por enquanto não há dias nem anos

existe apenas uma planta viçosa

de que desejas ser semelhante

 

Para ser irmão das plantas

é preciso crescer na vida

ser sólido quando na morte

Ora eu sou somente imóvel

e mudo como um planeta

Vou banhando os pés nas nuvens

que como bocas em volta

me condenam a ficar

entre os que parados estão

e que as plantas desesperam

 

No entanto um dia

os líquidos revoltados

lançarão para as nuvens

armas assassinas

manejadas pelas mulheres azuis

como os olhos das filhas do norte

 

E esse dia será dentro de um ano e um dia.

 

 

 

CANÇÃO DO PESCADOR

 

(Carlos Alvarez)

 

As redes tenho-as eu cheias

(mas as mãos estão vazias)

Que as redes são do meu amo

e as mãos são minhas.

 

Que deserto estava o mar

debaixo do anoitecer!

Com o seu suor o enchem

os que no mar vão morrer.

 

E que escuro estava o campo

hoje pela madrugada!

Com estas mãos chamaremos

toda a luz da alvorada.

 

Quando terás tu a terra

e o mar por pão?

Tuas as barcas e as redes

firmes na mão?

 

 

 

ÀS VEZES...

 

(Salvador Espriu)

 

Às vezes é forçoso é necessário

que por um povo inteiro um homem morra

Mas nunca um povo inteiro deverá morrer

por um só homem:

disto te lembres sempre, Sepharad.

 

As pontes do diálogo faz seguras

e trata de compreender e de estimar

as razões e as falas diversas dos teus filhos.

 

Que a chuva mansamente se despenhe

nas fartas sementeiras

e que o ar atravesse os campos extensos

como estendida mão   benigna e suave.

 

E que viva Sepharad eternamente

na ordem e na paz e no trabalho

e na difícil  quão difícil  mas merecida

 

inteira liberdade.

 

 

 

O PTERODÁCTILO

 

(Philip Jose Farmer)

 

Remoto pai primevo de esvoaçantes plumas futuras

pelo cerebral jurássico vais num estremeção

de asas coriáceas   temeroso

de te embrenhares nos lameiros onde os sáurios

resolvem seus assuntos de ilhargas e dentes.

Predador metafísico de dedos alados

o canto entorpecente dos teus intestinos

revela o entusiasmo com que absorves

saborosos ectoplasmas   esbanjando

o teu fogo interior que pressagia

a imagem futura de um esqueleto

morto na tentativa de ficar.

 

Bicudo resumo da incorpórea idéia

passarola batida pelas lufadas de vento

cruzas abstractas névoas   invadindo o mar da Obra.

Devoras estranhos peixes    desenvolves

largas penas brilhantes e recobres

com a carne da forma os ossos do conceito.

 

Assim deriva

do acto de Beleza   a beleza do Acto.

 

 

(Traduções de Nicolau Saião)

 

 

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