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Nuno de Matos Duarte

 

DOIS POEMAS DE JOSÉ MARíA CUMBREÑO

 

 

A SEMENTE

 

A memória do bosque espera no descampado

que a chuva anuncie o seu acordo com a sede.

 

Porque é uma semente a calma da árvore.

Porque uma árvore sem sombra também pode dar fruto.

 

A mulher do lenhador

contempla o ventre e sorri.

 

A evaporação e o degelo.

 

Deixar de ser para ser.

 

A memória do bosque

molda em silêncio a forma de uma folha

e a lembrança de uma ruína.

 

Quando a seiva subir até à verdura da luz,

imolando-se,

hesitando entre a cara e a coroa.

 

O pólen, que parecia tão frágil,

sobreviveu ao deserto.

 

Deixar de ser para ser.

Negação.

Vertigem do prelúdio.

 

O estalar das sombras estremece a cisterna.

 

Inutilmente esvoaça, inutilmente tenta

respirar o insecto preso no âmbar.

 

 

 

O EUCALIPTO

 

O gado não tem que pastar.

 

Uma alavanca

activa o mecanismo do relógio

e as armas de fogo.

 

Os músculos do réptil

contraem-se para asfixiar as suas presas.

 

Conhecem as reses os arbustos venenosos.

 

A sombra do eucalipto

não alivia o cansaço.

 

O percussor.

 

As vinhas expropriadas

por onde passará a auto-estrada.

 

O pêndulo.

 

Por detrás daquelas dunas é a praia

um deserto.

 

As crianças que morrem estranguladas

pelo cordão umbilical.

 

O macho que comeu as crias

para que assim as fêmeas entrem de novo no cio.

 

Árvore só numa clareira do bosque.

 

Estéril como terra

que se regasse com água salgada.

 

 

(Tradução de Ruy Ventura)

 

 

NOTA: José María Cumbreño, nascido em Cáceres (Espanha) em 1972, é membro do conselho de redacção da revista El Espejo e esteve durante vários anos ligado ao mundo da rádio. Até ao momento publicou dois livros de poemas: Las ciudades de la llanura (2000), finalista do prémio Rafael Albertí, e Árbol sin sombra (2003), que recebeu o Prémio de Poesia "Cidade de Badajoz". Os poemas traduzidos pertencem ao seu mais recente livro.

 

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