SONÊTO DA VÉSPERA

 

Para meu pai, ausente.

 

Passo de um ano para outro: envelheço.

A face contra o espelho agora diz

que já não sou o mesmo e a cicatriz

fica no tempo: é tudo que mereço.

 

Assim, êste meu rosto é o enderêço

das minhas dores. Pego, então, de um giz

tento riscar um número infeliz

de aventuras: são tantas que me esqueço.

 

Recolho a face, o espelho parte. Em mim

cai lento um mar de múltiplas lembranças:

em tôdas elas sempre fui herói.

 

Fiz guerrilha de rua contra rua;

fui campeão de tôdas as corridas,

hoje, sou homem feito e isto me doi.

 

 

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